Com flagra histórico, biólogos realizam novo estudo da fauna para a Nova Ferroeste

Esta é a quarta e última campanha da fauna, que vai compor o Estudo de Impacto Ambiental (EIA/RIMA) do projeto. A Nova Ferroeste vai ligar Maracajú (MS) a Paranaguá. No geral, o levantamento está sendo realizado em oito pontos dos 1.304 quilômetros de extensão da ferrovia.
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27/10/2021 - 11:30

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Uma equipe de biólogos que atua nos estudos exigidos pelo projeto da Nova Ferroeste iniciou na semana passada a quarta e última campanha da fauna, que faz o levantamento e identificação das espécies existentes nas áreas do traçado da ferrovia. Espécies endêmicas de anfíbios, anta, onça-parda, aves e animais ameaçados de extinção foram identificados na Serra do Mar, onde foram realizados os trabalhos.

No geral, o levantamento está sendo realizado em oito pontos dos 1.304 quilômetros de extensão da Nova Ferroeste. O projeto do Governo do Paraná é de uma linha férrea ligando Maracaju, no Mato Grosso do Sul, ao Porto de Paranaguá, e que também vai ampliar e modernizar o trecho já existente, entre Cascavel e Guarapuava.

A campanha da fauna acontece nas quatro estações do ano e faz parte do Estudo de Impacto Ambiental (EIA/RIMA) realizado pela Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas – Fipe. Levantamentos do solo, da flora e da fauna são algumas das atividades que estarão contidas no relatório final do EIA/RIMA, a ser entregue nos próximos meses.

Essas informações vão orientar o projeto de engenharia da Nova Ferroeste e definir mudanças que possam mitigar o impacto dos trilhos, além de estabelecer as passagens de fauna.

A Serra do Mar é o local com maior diversidade e número de espécies. Embora esta etapa seja a da estação da primavera, os primeiros trabalhos da campanha começaram no inverno. Com capas de chuva e botas de borracha quase até os joelhos, os biólogos adentram a mata sob fina garoa para montar as armadilhas. É a quarta vez que eles percorrem as trilhas abertas na primeira campanha, em janeiro de 2021.

“Nossa intenção é abranger toda a diversidade ao longo do traçado da Nova Ferroeste. Aplicamos vários métodos para, justamente, detectar e registrar o maior número de espécies possível”, explicou o biólogo Raphael Santos.

Diversas espécies identificadas pelo grupo estão ameaçadas de extinção por conta da caça ilegal. Ao longo dos 55 quilômetros da descida da Serra do Mar, serão construídos 25 viadutos, 10 túneis e 4 pontes – um total de 17 quilômetros de viaduto, oito quilômetros de túnel.

Essas obras de arte previstas no projeto da ferrovia reduzem a necessidade de desmatamentos e conservam boa parte dos ambientes da maneira como se encontram. “O maior impacto da construção da ferrovia é a supressão de mata, e isso vai ser bem pontual. A gente espera que a instalação de passagens de fauna permita o trânsito seguro dos animais mesmo com os trens em movimento”, avaliou Santos.

ESPÉCIES ENDÊMICAS – Duas áreas, em São José dos Pinhais e Morretes recebem a equipe, que procura por mamíferos, aves, répteis e anfíbios. Para cada grupo, há técnicas de captura e classificação distintas. Mas pegar o animal é só uma das maneiras de saber quais espécies habitam naquela região. Os sons vindos da mata, a visualização e armadilhas fotográficas revelam muito da rotina que os olhos dos profissionais não avistam.

Na ronda noturna, sob chuva forte e em meio à escuridão da floresta, os biólogos capturaram uma perereca comum, uma perereca verde, com contornos vermelhos nos olhos, e a rãzinha do foliço, com apenas 1,5 cm. Cerca de 100 espécies de sapos, rãs e pererecas foram identificadas no monitoramento no Paraná e no Mato Grosso do Sul, e 50 delas estão na Serra do Mar.

O biólogo Guilherme Adams destaca que 40% destas 50 espécies são endêmicas da Mata Atlântica. “A rãzinha do foliço só é encontrada na Serra do Mar. Isso demonstra o quanto esse ambiente é importante. A rã de riacho, também encontrada aqui, está na lista de animais ameaçados de extinção, e todos eles são bioindicadores”, afirmou.

Conforme a temperatura aumenta, agora na primavera, as aves arriscam os primeiros voos e aos poucos ficam presas nas redes das armadilhas. Com muito cuidado, são retiradas e acomodadas em sacos de algodão. Os dois primeiros exemplares foram da ave chamada catraca, que possui tons que passam pelo branco, marrom e verde-oliva e que habita os bambuzais nativos da região, e da tovaca, que costuma circular perto do solo à procura de alimento.

No dia de chuva fina, foi a vez de elas serem classificadas e registradas pelo grupo. Medidas e pesadas, todas as aves recebem uma anilha com numeração e são devolvidas nos locais da captura. Algumas espécies requerem habilidade quase cirúrgica para prender a peça de metal nas perninhas, como no caso do beija-flor de apenas quatro gramas.

“A primavera é tempo de renovação na natureza, em especial para as aves. Inúmeras espécies retornam para cá para se reproduzir nessa época. Por isso é um período considerado chave para o nosso estudo”, disse Raphael Santos.

REGISTROS RAROS As armadilhas fotográficas são grandes aliadas para estudar os mamíferos. Câmeras com sensores de movimento são instaladas em locais estratégicos para flagrar a atividade que só ocorre longe da presença humana. Foi dessa maneira que os pesquisadores fizeram um registros raros e inéditos na Serra do Mar.

Uma anta, cuja presença os biólogos já conheciam, passou calmamente em frente a uma das lentes. No relatório já havia o depoimento dos moradores sobre existência de fezes, rastros e pegadas deste animal, que pode medir até dois metros e pesar quase 300 quilos. Faltava a imagem.

“Gravamos uma anta e também uma onça-parda, que são espécies extremamente importantes para a conservação e preservação desses ambientes. Esses animais só conseguem sobreviver em áreas preservadas. Eles necessitam de grandes maciços verdes porque têm hábitos bem específicos, é difícil conseguir detectar essas espécies porque chegam a percorrer até 20 quilômetros num dia”, relatou a bióloga Emanuelle Pasa.

Uma equipe de biólogos que atua nos estudos exigidos pelo projeto da Nova Ferroeste iniciou na semana passada a quarta e última campanha da fauna, que faz o levantamento e identificação das espécies existentes nas áreas do traçado da ferrovia. Espécies endêmicas de anfíbios, anta, onça-parda, aves e animais ameaçados de extinção foram identificados na Serra do Mar, onde foram realizados os trabalhos.Foto: Conrrado Age/AEN
As informações vão orientar o projeto de engenharia da Nova Ferroeste e definir mudanças que possam mitigar o impacto da passagem dos trilhos. Foto: Conrrado Age/AEN

CONSERVAÇÃO – Para o coordenador do Plano Estadual Ferroviário, Luiz Henrique Fagundes, a conservação do meio ambiente é uma das principais preocupações desde o início da elaboração do projeto da ferrovia. “A Serra do Mar é uma das joias do Paraná, por isso procuramos combinar as melhores opções de traçado e de engenharia para provocar o menor impacto possível”, afirmou.

Os trilhos da Nova Ferroeste serão construídos na área de domínio da BR-277, sempre que o relevo permitir. Essa escolha segue a orientação do Plano de Desenvolvimento Sustentável do Litoral (PDS-L), elaborado em parceria entre o Governo do Estado, pesquisadores, ONGs e sociedade civil.

As informações levantadas pelos biólogos durante as quatro estações também podem servir de base para programas de educação ambiental e planos de manejo de Áreas de Proteção Integral, e assim aliar a conservação e o ecoturismo na Serra do Mar.

“O turismo pode garantir a conservação dos ambientes naturais ainda remanescentes, porque a atividade turística gera renda para os moradores. E com a geração de renda as manter a floresta, não vão modificar todos esse ambiente para instalar uma lavoura ou pastagem”, concluiu Santos.

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