A Universidade Estadual de Maringá (UEM) está desenvolvendo um projeto de capacitação em horticultura para pessoas em situação de rua e pacientes em tratamento de dependência química no Noroeste do Estado. O objetivo é promover a ressocialização por meio da laborterapia, também chamada de terapia ocupacional, uma técnica psicoterapêutica que usa o trabalho para afastar os problemas causados pela falta de ocupação.
A iniciativa foi contemplada com aporte financeiro de R$ 185,4 mil, oriundos do Fundo Paraná, que apoia o desenvolvimento científico e tecnológico, com o financiamento de programas e projetos de pesquisas institucionais. Esses recursos foram utilizados para o pagamento de bolsas de estudantes selecionados para as atividades práticas.
De acordo com Gisele Onuki, coordenadora de Ensino Superior da Superintendência Geral de Ciência, tecnologia e Ensino Superior, esse tipo de projeto promove a interação transformadora entre a universidade e a sociedade e, também, enriquece a aprendizagem dos estudantes ao associar o conhecimento ao exercício da cidadania, dos direitos humanos e do compromisso social.
“Essa troca de experiências auxilia na formação mais completa dos futuros profissionais, aperfeiçoando a capacidade de diálogo, autonomia e gestão emocional, para o exercício de uma liderança mais humanizada em alta performance”, afirma Gisele.
Dentro do projeto considerado piloto, as atividades são desenvolvidas nas proximidades da Fazenda Experimental da UEM, nas chácaras Coração Eucarístico de Jesus e Recanto Mundo Jovens, ambas localizadas no Distrito de Iguatemi, na zona rural de Maringá.
Uma parceria entre o Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR), por meio da Vara de Execução de Penas e Medidas Alternativas de Maringá, e a Associação dos Moradores Ecologicamente Corretos de Maringá (Amecom), possibilitou a instalação de duas casas-de-vegetação (estufas) para as práticas agrícolas voltadas à horticultura.
Doutor em Agronomia e responsável pela coordenação do projeto, o professor da UEM José Gilberto Catunda Sales explica que as pessoas assistidas recebem orientação sobre montagem, plantio e desenvolvimento de culturas de diversas espécies hortícolas e arbóreas, além de cursos sobre máquinas e implementos agrícolas. “Os participantes plantam tomate, alface, almeirão, maracujá, cenoura, abobrinha, entre outras hortícolas”, enumera.
Ele ainda destaca os aspectos de segurança alimentar e nutricional, uma vez que a produção é consumida pelos próprios envolvidos, todos residentes das chácaras. “Essa população dependia muito de doações de alimentos, mas depois de seis meses de aprendizado se tornou autossuficiente, pelo menos em itens como verduras, legumes e frutas”, destaca Sales.
O projeto reúne cinco estudantes de graduação em Agronomia da UEM, sob a orientação de três professores do Centro de Ciências Agrárias da instituição. Três vezes por semana, eles se deslocam às chácaras para ensinar as técnicas e definir as tarefas a serem executadas no dia a dia pelos participantes. Até o momento, a ação já alcançou, diretamente, cerca de 350 pessoas, que se dedicam a cavar a terra, plantar as mudas, regar e irrigar as plantas e cuidar da horta.
“Para os alunos, é uma excelente oportunidade para aplicar o aprendizado teórico, inclusive como se comportar e agir com empatia e sensibilidade à situação das outras pessoas”, explica o professor, ressaltando os aspectos didáticos e pedagógicos da ação na formação dos futuros profissionais. “Aprendemos muito mais quando ensinamos”, ressalta.
EXPECTATIVAS – A UEM pretende iniciar uma nova fase do projeto após a pandemia do novo coronavírus (Sars-CoV-2). O intuito é estender a participação a estudantes e professores de outros cursos, como Psicologia, Odontologia, Enfermagem e Medicina, para propiciar orientações básicas de prevenção à saúde física, bucal e mental do público assistido, contribuindo ainda mais para a melhoria da qualidade de vida dessas pessoas.
Também há possibilidade de ampliação das cadeias produtivas, a exemplo da produção de flores, com expectativa de geração de renda para essa parcela da população. Além disso, a universidade articula parcerias com órgãos governamentais de fomento rural e de expansão da base de agroecologia para a produção de alimentos de qualidade, como o Instituto de Desenvolvimento Rural do Paraná-Iapar-Emater (IDR-Paraná).
SAÚDE – A dependência química é uma doença causada pelo consumo repetitivo de determinadas substâncias, trazendo prejuízos severos aos indivíduos e familiares. A Organização Mundial da Saúde (OMS) define essa condição como uma doença crônica e progressiva, ou seja, que piora com o passar do tempo; primária, pois gera outras doenças; e fatal. Por isso, atualmente, o uso de entorpecentes é considerado um grave problema de saúde pública.
Estudos científicos comprovam que diversas abordagens psicoterapêuticas têm sido eficazes no tratamento da dependência química. O professor acredita que esse projeto pode restabelecer o bem-estar para essas pessoas, proporcionando uma alternativa de vida sem o consumo de entorpecentes.
“O tratamento para a dependência química, por exemplo, pode aliar diferentes estratégias, inclusive a terapia ocupacional, capaz de proporcionar resultados significativos, mantendo as mentes desses pacientes ocupadas, e até mesmo devolver um propósito de vida”, enfatiza Sales. “Esse tipo de iniciativa ajuda essas pessoas a refletirem sobre como o uso abusivo de drogas faz com que percam suas identidades e autonomia como cidadãos”, conclui o docente.