Novo programa habitacional vai atender 2.500 famílias por ano

É o caso de Joice Valério Gomes, de Jandaia do Sul, que hoje vive em casa precária e insalubre. Ela faz parte das 75 famílias de Jandaia do Sul, que serão primeiras beneficiadas pelo programa do Governo do Estado que garantirá moradia digna e ações de inclusão social.
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16/12/2019 - 12:10
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A dona de casa Joice Valério Gomes, de 23 anos, mora em uma favela e divide a casa de quatro cômodos com o marido, os quatro filhos pequenos e alguns visitantes que não são bem-vindos: ratos, baratas e até cobras e morcegos já entraram no local, levando apreensão e mesmo doenças para a família. Moradora da Vila Santo Antônio, em Jandaia do Sul (Vale do Ivaí), ela faz parte das 75 famílias que serão as primeiras beneficiadas pelo programa Vida Nova, iniciativa do Governo do Estado para reduzir o número de favelas no Paraná.

O projeto-piloto do Vida Nova, que será implantado em Jandaia do Sul, foi lançado pelo governador Carlos Massa Ratinho Junior no final de novembro, e as casas deverão ser construídas no ano que vem. A previsão é que sejam atendidas 2.500 famílias por ano, de todo o Estado, até de 2022.

Assim como os seus vizinhos, Joice conta os dias para embarcar com a família no Vida Nova e deixar para trás a residência precária, os dias de chuva que trazem ameaças de deslizamento e os bichos que causam riscos às crianças e adultos.

“A chuva quando vem, sai arrastando tudo, entra dentro de casa. Tem muitos bichos, ratos enormes, já entrou cobra e um morcego que pousou no carrinho da bebê. Meu filho está com cobreiro por causa disso”, conta Joice, que mora na vila desde que nasceu. “Não vejo a hora de ir para o novo lugar. A estrutura vai ser melhor, porque minha casa está caindo, tem buraco para todo lado. Não vai ter bicho entrando na casa da gente e terá espaço para as crianças se distraírem”, visualiza Joice.

DESABOU - Algumas ruas e meio século de vida separam Joice da pensionista Maria de Lourdes Antunes, uma das moradoras mais antigas do local. Lourdinha, como é chamada, tem 73 anos e vive na Vila Santo Antônio há 37. A primeira casa que construiu no local, feita com madeiras reaproveitadas de uma antiga igreja, não aguentou um temporal e desabou alguns anos após ser construída.

A residência que hoje ela divide com a filha e os netos não está em situação muito melhor. As paredes de madeira estão velhas e o telhado de fibrocimento, que também foi substituído após um destelhamento, está cheio de goteiras.

“Quando chove molha tudo, as paredes estão podres, está caindo tudo, as telhas estão quebrando e eu não tenho mais como arrumar. A fossa é na frente de casa, isso nem faz bem. Rato e barata é o que mais tem”, diz. “Nunca tive gosto de ter uma casa bonita, boa. No final da vida ganhar uma casinha é a alegria da gente”, afirma.

PROGRAMA –Mais que moradias populares, o programa se destaca por englobar ações multidisciplinares que envolvem 16 órgãos estaduais e um objetivo comum: fazer a inclusão social das famílias, dando acesso completo e integral às políticas públicas do Estado.

“É um programa que pode ser exemplo para o mundo, por trabalhar com ações integradas que trarão uma perspectiva real para essas famílias. Além de casas novas e seguras, elas terão acesso a serviços públicos, projetos educacionais e de capacitação profissional”, afirma Ratinho Junior. “É a primeira vez que o Estado propõe um programa de desfavelamento no Paraná, que vai tirar pessoas de áreas de risco, extremamente carentes, para dar a elas dignidade e qualidade de vida”, ressalta.

Os moradores serão realocados para casas populares que serão construídas pela Cohapar em um local apropriado, dentro da malha urbana do município. Como se trata de pessoas em situação de vulnerabilidade social, os imóveis serão repassados gratuitamente aos futuros proprietários.

ÁREAS PRIORITÁRIAS – Por meio do Plano Estadual de Habitação de Interesse Social, em que as prefeituras incluem todas as informações sobre os problemas habitacionais dos municípios, a Cohapar identificou 879 assentamentos precários (favelas) em todo o Paraná. Entre estes, foram selecionadas 137 áreas prioritárias, que serão atendidas pelo Vida Nova.

A previsão da Cohapar é realocar 2,5 mil famílias por ano até 2022, priorizando as que moram em assentamentos localizados em áreas públicas, em municípios cuja ação signifique a erradicação das favelas. O público-alvo do programa são pessoas com renda familiar mensal de até três salários-mínimos, residentes em áreas de ocupação irregular.

“Todas órgãos de governo estão trabalhando de forma convergente para resolver os problemas das famílias que vivem em situação precária”, explica o superintendente de Programas Habitacionais da Cohapar, Kerwin Kuhlemann. “Os municípios também são parceiros importantes. As novas moradias serão construídas em terrenos cedidos ou adquiridos pelas prefeituras”, diz.

DIAGNÓSTICO – O trabalho multissetorial para a implantação do Vida Nova começou com o diagnóstico das famílias de Jandaia do Sul e o mapeamento da área onde vivem. O objetivo foi identificar quais políticas públicas são mais necessárias e se as pessoas precisam de um atendimento específico nas áreas de saúde, educação, assistência social ou segurança, por exemplo.

Elaborado pelo Instituto Paranaense de Desenvolvimento Econômico e Social (Ipardes) e aplicado pela Coordenadoria Estadual de Proteção e Defesa Civil, o questionário levou em conta tanto as questões socioeconômicas dos moradores como a disposição do loteamento com relação à infraestrutura e o acesso a equipamentos públicos.

A Defesa Civil foi a campo conversar com os moradores e recolheu dados sobre frequência escolar, trabalho, número de pessoas com dificuldade de mobilidade ou que usam medicamentos controlados, acesso a escolas, unidades de saúde e hospitais, proximidade a áreas de lazer, farmácias e outros serviços, estrutura do domicílio, tempo de moradia na região e a percepção dos moradores sobre o local.

Os dados foram compilados no Sistema Informatizado de Defesa Civil (SISDC), ferramenta que mapeia as áreas de atenção do Estado e que auxilia na gestão de risco a desastres nos municípios. O órgão também fez imagens com drones, que permite visualizar a área e facilita a tomada de decisões.

“O resultado foi muito bom porque fizemos uma pesquisa quantitativa e social sobre a população que reside nessa área. É um local que merece atenção, por estar próximo a um córrego e em uma área de declive que está sujeita a desabamentos”, explica o coordenador estadual da Defesa Civil, coronel Ricardo Silva.

RESIDÊNCIAS – O levantamento constatou que todas as residências têm ligação de água e energia, mas quase não há coleta e tratamento de esgoto. A maioria dos entrevistados declarou utilizar fossa rudimentar (53,7%); 12,2% dizem que despejam o esgoto no rio ou córrego; e 9,8% afirmam que têm acesso à rede geral de esgoto, mesma porcentagem de quem diz utilizar fossa séptica.

Sandra Mara Fávaro, coordenadora do Centro de Referência em Assistência Social (Cras) de Jandaia do Sul, explica que embora as residências tenham acesso à água e energia, muitas ligações são irregulares. “As casas não têm esgoto, os moradores puxam rabicho de água e de luz, não tem estrutura alguma”, afirma. “Este programa será um grande diferencial na vida dessas pessoas, as crianças vão crescer em um ambiente melhor, sem poluição, com estrutura. Eles terão a oportunidade que merecem”, ressalta.

O auxiliar de serviços gerais Gilson Ferreira da Silva, de 58 anos, confirma essas informações. Morando há três anos no local com o filho de 29 anos, em um barraco de madeira de três cômodos, ele teve que voltar a utilizar lamparina, porque o vizinho de onde ele “puxava luz” cortou o acesso. “Fico muito feliz em saber que terei uma casa para morar. Eu nunca tive uma casa, até comprar esse barraco. Estou levando a vida assim, com dificuldade”, diz.

Outra questão apontada no diagnóstico são os dados estruturais dos domicílios: 41,5% são de alvenaria; 24,4% de madeira aparelhada; 19,5% de madeira reaproveitada e 14,6% são mistos (madeira e alvenaria). Quase metade deles tem piso de cerâmica, lajota ou pedra (43,9%); 34,1% de concreto ou cimento; 14,6% de madeira reaproveitada e 7,3% de chão batido.

Roseli Rodrigues da Silva, de 47 anos, fala com orgulho do chão de sua casa, feito por ela e os filhos com lajotas de reaproveitamento. “O povo que ajudou a fazer nossa casa, um dava a areia, outro o tijolo e assim a gente fez. Ela tem uns problemas, muita goteira, mas é um lugar para morar”, conta.

“Não vejo a hora de ter uma casinha minha, no meu nome e do meu marido, coisa que a gente nunca teve. É uma segurança para os dois netos que eu cuido. Tomara que saia logo, para a gente pelo menos sair do barro”, diz, citando o lamaçal que se forma no caminho até a sua residência nos dias de chuva e que dificulta a locomoção da família.

ÁREA DE PRESERVAÇÃO – A Vila Santo Antonio está localizada em uma área de preservação ambiental, próximo à nascente do rio Marumbi, que abastece Jandaia do Sul. O volume de água no manancial, que integra a Bacia do Alto Ivaí, já foi considerado crítico, consequência da ocupação irregular na área.

A realocação das famílias também busca resolver esse problema. Após a desocupação das residências, o local passará por um processo de revitalização ambiental, coordenado pela Sanepar. A intervenção prevê a demolição das estruturas existentes, limpeza e implantação de um parque. Além de oferecer uma opção de lazer à população de Jandaia do Sul, o projeto também evita a reocupação irregular da região.

Além da ocupar uma área de preservação, o terreno onde as famílias vivem hoje também está no mapa de atenção da Defesa Civil por causa da possibilidade de ocorrências de deslizamentos. O diagnóstico aplicado no local mediu a percepção de risco das famílias e mostrou que 34,1% delas percebem o risco de enchentes; 31,7% de drogas; 29,9% de desabamentos e deslizamentos, 24,4% de assaltos, agressões e violências; e 14,6% de incêndio.

Essas são questões que pesam no desejo de Joice de se mudar para uma casa e uma vida melhores. “É difícil segurar as crianças em casa, elas saem e vão direto para a rua, é perigoso. Na rua é perigoso, no quintal também e em casa eles não ficam. A gente quer um lugar seguro”, completa.

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