Mulheres indígenas criam associação e melhoram a vida na aldeia

Lídia Takua e as demais mulheres da Aldeia Tekohá Marangatu, em Guaíra, tiveram apoio do Instituto de Desenvolvimento Rural do Paraná para formar a associação e avançar em questões de saúde, como prevenção ao câncer de mama e de útero, e  no campo da geração de renda, artesanato e agricultura familiar.
Publicação
23/09/2020 - 11:57

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É em uma aldeia indígena da etnia Guarani, no Oeste do Paraná, que a dona Lídia Takua Rero Ysapy Álvares Chaparo mostra como é possível ser visionária e dar voz às mulheres em um ambiente tradicionalmente masculino. Com o apoio do Instituto de Desenvolvimento Rural do Paraná (IDR-Paraná), ela e as demais mulheres formaram uma associação que as ajuda a ter voz ativa e a melhorar a vida na aldeia.

A Aldeia Tekohá Marangatu, em Guaíra, reúne 95 famílias. São 570 pessoas ao todo, sendo 273 homens e 297 mulheres. Mesmo elas sendo a maioria, eram eles que tomavam as decisões sobre o futuro da aldeia nas reuniões. “A gente ficava no fundo da sala, em silêncio, ouvindo o que eles decidiam, com as instituições, sobre assuntos que impactariam diretamente a todos nós da comunidade. Não só aos homens, mas também às mulheres, aos jovens e às crianças. Só que nossas opiniões não eram ouvidas”, conta dona Lídia.

Esta situação a incomodou de tal forma que ela procurou o IDR-Paraná: “Estava na hora de as mulheres terem voz ativa nas reuniões. Estes encontros debatiam temas que depois afetariam a todos: saneamento, distribuição de cestas básicas, saúde, infraestrutura, educação”.

CAMINHANDO EM FRENTE - A engenheira agrônoma do escritório de Guaíra, Rita de Cássia Ribeiro, conta que a dona Lídia procurou o Instituto de Desenvolvimento Rural do Paraná – Iapar-Emater com a ideia de criar uma associação de mulheres na aldeia, mas precisava de ajuda. Foi criada a Associação Mba Apo Mboguata Porã, que significa Caminhando em Frente.

“O IDR-Paraná auxiliou na formação da Associação, especialmente na orientação de o que é uma associação, o que representa, como a eleição poderia ser feita, os prazos, as custas, aspectos legais. Assim, auxiliamos na elaboração do estatuto, construção do regimento interno, digitalização de toda documentação, entre outras questões que elas precisavam de apoio”, comenta Rita.

Mesmo com toda dificuldade na comunicação, já que nem todas as indígenas entendem perfeitamente o português – elas falam o Guarani - o IDR-Paraná conseguiu organizar um calendário mensal de reuniões com temas escolhidos pelas mulheres da comunidade. “Buscávamos as profissionais no serviço municipal e, também, voluntárias para falar sobre os assuntos escolhidos.  Sempre eram demandas que traziam preocupações para o grupo”, aponta Scheila Juliana da Silva, assistente social do IDR-Paraná.

REUNIÕES - A primeira reunião do grupo foi sobre depressão, abordando a maior incidência da doença entre as mulheres e o suicídio entre os jovens. Uma psicóloga falou sobre o tema ajudando a identificar os sinais da doença e como prevenir. A abordagem abrangeu questões do contexto social em que a comunidade vive, direitos básicos e situações de violência e abusos.

Na sequência, as mulheres receberam orientações sobre a saúde feminina, como prevenção ao câncer de mama e do útero, métodos contraceptivos, doenças sexualmente transmissíveis. Assim como instruções no campo da geração de renda, artesanato e agricultura familiar.

IDR-PARANÁ - Para esta comunidade, o Instituto exerceu não só a função de prestar assistência técnica e extensão rural, mas uma função social de colaborar na criação da associação e inseri-la na programação dos Projetos Coletivos.

“Agora, o próximo passo é promover melhorias na confecção do artesanato e criar um espaço onde mais mulheres possam ser incorporadas a este movimento. Ao invés de elas produzirem seus produtos embaixo das sombras das árvores, elas podem ter uma oficina para isso”, explica Rita.

SONHOS - Dona Lídia se tornou a presidente da Associação e já enxerga os benefícios conquistados em tão pouco tempo de trabalho – serão dois anos em dezembro de 2020. “As mulheres estão melhor de saúde. Passaram a se cuidar mais e tivemos menos casos de suicídio na Aldeia. Além disso, nossas meninas deixaram de casar tão cedo. Antes, se casavam com 13, 14 anos e já eram mãe antes dos 15 anos. Porque elas precisavam ter o apoio de um marido para a sobrevivência. Hoje, já temos meninas com 19 anos que ainda não casaram e querem realizar seus sonhos”, comemora a indígena.

Das 14 aldeias da etnia Guarani na região Oeste do Estado, apenas uma tem uma vice-cacique. As demais são lideradas por figuras masculinas. Os bons resultados logo chegarão a mais aldeias. A Tatury, também em Guaíra, já reúne 13 mulheres interessadas em criar um grupo parecido. Ela ainda espera que, com o grupo, as mulheres possam ter seus espaços de trabalho, melhorias nas condições de emprego e renda, mais oportunidades de aprender novas profissões e que mais mulheres sigam o exemplo de força dela.

“Uma vez recebemos a visita de uns procuradores de Brasília na nossa aldeia. Eles só nos faziam perguntas e mais perguntas. Nós estávamos cheios de problemas e eles só nos questionavam. Nenhum homem ou líder da Aldeia fez uma pergunta sequer. Eu me levantei e falei: ‘eu quero soluções, não perguntas’”.

ETNIA GUARANI NO OESTE - Somente em Guaíra ficam cerca de 1,3 mil indígenas, que estão espalhados por oito áreas. Outros seis acampamentos ficam na região de Terra Roxa. Em Guaíra, a retomada das terras Guarani começou em 1988 com a ocupação Tekoha Jevy, próxima ao aeroporto de Guaíra, e Tekoha Porã, no mesmo ano. No município atualmente existem oito Tekohas: Y Hovy, Marangatu, Karumbe'y, Guarani, Mirim, Porã, Jevy e Tatury.

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