O Programa Cultivar Energia, da Copel, já soma mais de 40 mil metros quadrados de área destinada para plantio de hortaliças e legumes em faixas de segurança de linhas da empresa no Paraná. São 11 hortas em pleno funcionamento, viabilizadas em parceria com as prefeituras de Curitiba, Ponta Grossa, Cascavel, Francisco Beltrão, Umuarama e Maringá – onde a semente do Cultivar Energia foi plantada com um projeto-piloto em 2013, que rendeu bons frutos.
Após a experiência bem-sucedida, a Copel definiu critérios técnicos para uso das áreas sob linhas de transmissão e vem expandindo a iniciativa, que já conta com 377 horticultores. Considerando que cada um deles produz alimento suficiente para distribuir entre parentes, amigos e organizações sociais da comunidade e, ainda vender o excedente, são milhares de pessoas beneficiadas.
Segundo levantamento da Copel, em cada horta são produzidas, em média, de 3 a 3,5 toneladas de alimentos por mês. Somando todas as hortas do Estado, são pelo menos 33 toneladas de verduras, legumes e frutas orgânicos todos os meses.
E esse impacto positivo vai crescer ainda mais. Estão em fase de implantação duas novas hortas em Curitiba, duas em Cascavel, uma em Londrina, uma em Almirante Tamandaré e outra em Apucarana.
Na dinâmica do programa, o município oferece a assessoria técnica para a agricultura urbana e a Copel é responsável pela cessão de uso da faixa, limpeza da área, instalação de cercas e orientação permanente a respeito da segurança no utilização do espaço.
“Mas para uma nova horta dar certo, o principal fator de sucesso é o desejo da comunidade de se organizar para usar o espaço com essa finalidade. Sem isso, fica inviável, porque o cultivo exige atenção e trabalho diários”, destaca o assistente social Rafael Carmona, um dos coordenadores do Cultivar Energia na Copel.
RELAÇÃO COM A REDE – Logo na criação da horta os ganhos para os envolvidos ficam evidentes. O uso controlado do terreno e a instalação de cercas evita que o local seja ocupado de forma indevida ou acumule resíduos despejados irregularmente.
Na rotina de manejo, os horticultores têm como obrigação respeitar normas de segurança determinadas pela Copel. É proibido entrar na área em dias chuvosos e usar fios metálicos nos canteiros, por exemplo. As plantas cultivadas não podem ultrapassar dois metros de altura. As hortas são monitoradas pela empresa para garantir o pleno funcionamento e avaliação dos resultados.
Periodicamente, técnicos da Companhia reúnem-se com os grupos para reforçar a importância desses e outros cuidados no convívio com a rede elétrica – como o risco de acidentes por conta de pipas que enroscam nos fios e a proibição de soltar balões.
Com isso, ganham aliados nesse cuidado, como Josué do Nascimento, um dos beneficiários da Horta Augusta B, em Curitiba. “Já tem uns seis meses ou mais que as crianças não vêm, mas antes ficavam bastante soltando pipa. Ficavam no barranco que era mais alto. Agora, não estão vindo porque a gente proibiu”, garante.
Josué foi um dos líderes da formação da horta, há mais de dois anos. Trabalhou com os pais no campo na juventude e depois migrou para a cidade. Quando viu a oportunidade de retomar a lida com a terra, não pensou duas vezes. “Quando eles começaram, eu que preparei aqui e abri as valetas para a escoamento da água. Com o pessoal ajudando, mas eu estive à frente, dando aquele incentivo”, conta.
Hoje, ela já tem uma rede de clientes que valorizam a agricultura orgânica e compram parte da produção. "Eles perguntam o que eu tenho e vêm buscar. Aí eu mando por mensagem o que tem e eles pedem para fazer um combo. Foi passando de um para o outro e agora eu estou com a clientela. Tem mais de 30 pessoas”, diz.
À noite, ele trabalha como motorista no transporte coletivo da Capital e, durante o dia, dedica-se ao cultivo das hortaliças e legumes. “É cansativo, mas é gratificante para a gente. Para tirar o estresse, não tem igual. E tem depoimento de um pessoal que chegou aqui com depressão, falta de atividade, de locomoção, de movimentação. E sarou na horta”, diz Josué.
MAIS SAÚDE – A percepção de Josué a respeito dos benefícios do Cultivar Energia para o bem-estar dos participantes está correta e vai além. A agente de saúde Cristiane de Aquino trabalha há 20 anos na região das hortas Morumbi, em Curitiba, e acompanha de perto os resultados do projeto. Ela estima que as hortas impactam positivamente mais de 23 mil pessoas.
“Nós, da Unidade de Saúde, estamos sempre incentivando a comunidade para vir e consumir os alimentos, porque é uma comunidade carente. Às vezes, eles se queixam que não têm uma alimentação saudável. Acham que ir ao mercado comprar os congelados é saudável. A gente está mostrando o outro lado e, junto, trabalhamos com os estudantes de Nutrição e Enfermagem”, explica.
Cristiane destaca, também, os efeitos positivos da convivência comunitária. “Muitos são senhores que vivem sozinhos. Então eles passam o dia aqui e, com isso, têm ganhado qualidade de vida. Muitos são hipertensos, diabéticos e tiveram uma grande melhora”, diz.
Ela diz que o espaço acabou ganhando usos inesperados para os moradores do bairro, que visitam o local e admiram o trabalho. “Eles sabem que não podem mexer. Mas as crianças que não comiam as verduras, hoje comem. Comem cenoura, beterraba da horta”, completa a agente.
Cristiane conta, também, que há um grupo de adolescentes do bairro que frequenta o local como parte de um programa de prevenção de depressão. "A gente junta aqui as pessoas idosas com os jovens. Eles vêm aqui, conversam, trocam experiências. Hoje, estamos com um grupo de 45 jovens. Estão diminuindo a medicação só pelo fato de estarem aqui, uma terapia de grupo, vir mexer na terra, conhecer um pouco do produto, conversar com as pessoas”, garante.
SEM DEFENSIVOS – Todas as hortas do Cultivar Energia produzem alimentos orgânicos. Os participantes recebem a orientação necessária para ter uma boa produtividade sem precisar de defensivos.
Em Curitiba, também estão sendo feitos testes do uso de resíduos da poda de árvores – feita pela Copel para evitar desligamentos na rede. Os galhos são triturados e destinados às hortas urbanas para auxiliar os horticultores na recomposição do solo e melhora da produção.
João Soares de Lara foi criado na roça e também está feliz colhendo as hortaliças que cultiva com carinho. “Eu planto alface, couve, cebolinha, almeirão, beterraba. Consigo vender as sobras e, de vez em quando, nós doamos para a creche o que está sobrando também. Mas a maioria é para o consumo de casa”, diz.
Ele calcula que consegue produzir no canteiro verduras orgânicas para o consumo frequente de 15 pessoas e garante que a alimentação em casa melhorou. “Pelo menos se come uma verdura sadia, não tem veneno, não tem nada. Em vista disso, tem bastante economia”, completa.
A aposentada Elides Santa Rosa é um exemplo de como as hortas são benéficas não só para a saúde do corpo, mas também da mente. “Morei a vida inteira no sítio e gosto muito de mexer com terra. Venho na horta, até esqueço de ir embora. É uma terapia bem boa pra mim”, garante.
Com 80 anos de idade, morando no bairro há 22, ela mantém com muito zelo os canteiros. “Lido sem problema. Passo a mão na enxadinha e venho carpir aqui um pouquinho”, conta.
O aposentado Orlando Silva gosta de cultivar uma variedade grande de hortaliças. Basta uma passada rápida pelos canteiros que ele mantém para encontrar opções que não se acha no mercado, como um almeirão de folhas roxas e uma variedade de coentro que é típica do Vale do Ribeira, onde ele viveu por décadas. “É coentro. Eu conheço toda a vida, é coentro legítimo”, garante.
NOVA PAISAGEM – José Aparecido dos Santos não esconde a felicidade com a horta bem em frente à casa onde ele mora há 30 anos. “É lindo, não tem nem o que dizer, né? É muito maravilhoso isso”, afirma.
A satisfação é fruto de uma mudança radical que ele testemunhou nos últimos dois anos. “O pessoal passava à noite, descarregava o carro de lixo, deixava entulho, cachorro abandonado, guarda-roupa velho, sofá velho. Foi complicado. Aí, um belo dia a Copel liberou pra gente fazer isso aqui com a prefeitura. E é uma benção”, conta, orgulhoso dos quatro canteiros cheios de cores e texturas do repolho roxo e verde, escarola, salsinha, beterraba, alface-americana e romana, rabanete e cebolinha.
Janaína de Lima costumava ir à horta Marumbi I para comprar verduras. “Passava, via a plantação, via alguém aqui dentro e perguntava se tinha alguma coisa para vender”, conta. Um dia, uma das participantes do projeto disse a ela que a horta seria revitalizada, sobraria canteiro, e orientou Janaína a fazer um cadastro na associação que administra o espaço.
Foi o que ela fez, mesmo sem nenhuma experiência com a agricultura. "Fiz um cadastro, preenchi uma ficha, tudo certinho. Não demorou nem uma semana e eles me ligaram, perguntando se eu ainda tinha interesse. Aí eu comecei a plantar. Vim só com a força de vontade e perguntando para um, perguntando para outro como é que funcionava”, diz a bordadeira, que já deixou a profissão de lado.
Agora, Janaína cuida da horta, vende as hortaliças, além de doces e salgados que ela faz em casa. “É o amor que a gente está levando em forma de alimento. Porque é tudo saudável, tudo muito natural. Isso é muito bom para a vida da gente", arremata.