Com plateia lotada, o 1º Fórum Estadual de Hidrogênio Renovável do Paraná reuniu, ao longo de toda quarta-feira (3), no Museu Oscar Niemeyer, em Curitiba, especialistas da indústria, academia e formuladores de políticas públicas em torno de desafios e estratégias relacionados à produção e uso dessa matriz energética.
Os painéis se seguiram ao anúncio pelo governador Carlos Massa Ratinho Junior de uma série de medidas para criar uma política integrada em relação ao insumo, e trataram de temas que foram desde a produção do H2, passando pela competitividade, inovação e demandas de longo prazo.
Entre os temas pertinentes abordados pelos 20 especialistas reunidos em quatro painéis, os destaques foram a necessidade de integração dos atores envolvidos em pesquisas na área, a demanda de um arcabouço jurídico que dê segurança e estimule a implantação da tecnologia e a definição de uma modelagem de produção que leve em conta a realidade regional paranaense.
Para o secretário de Estado do Planejamento, Guto Silva, o fórum respondeu à altura a demanda por integração dos players na área, com um ambiente de debate livre e a presença de todos os elos dessa cadeia.
“A presença do setor produtivo, investidores e membros da academia, que trouxeram experiências e pesquisas com muita ciência, tecnologia e inovação, assim como o Governo do Estado, em suas diversas pastas que já pesquisam o hidrogênio verde, e de representantes de ministérios da Ciência, Tecnologia e Inovação e de Minas e Energia e de colaboradores de empresas e produtores, mostra que estamos no caminho certo, que viemos para jogar firme e para ganhar esse jogo”, disse.
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Segundo a advogada Irini Tsouroutsoglou, que trabalha com Direito Empresarial, Agronegócio e Direito Internacional Público e tem se aprofundado na questão da sustentabilidade, a discussão sobre o tema da transição energética tem se tornado urgente por questões ambientais e, também, por ações decorrentes das exigências impostas por diversos países.
“Este tema está se tornando preocupante porque essas questões podem virar obstáculos caso sejam usadas como argumentos para o estabelecimento de barreiras comerciais, o que pode ocorrer em um futuro próximo, o que tem acelerado a busca por uma energia mais limpa”, disse ela, que foi moderadora no painel que discutiu rotas de produção com foco em fontes locais.
Nesse sentido, além do uso de energias renováveis disponíveis no Estado para a produção do H2, como da energia hidrelétrica gerada por grandes e pequenas usinas no Paraná, foi sublinhado o protagonismo de outras fontes como da proteína animal, biogás, biometano, etanol e de subprodutos do saneamento, trazido à mesa pelo CEO da Sanepar, Claudio Stabile, que aposta no esgoto para uma produção em escala do H2, vistos os grandes números relacionados à empresa.
“Temos 8 milhões de paranaenses atendidos pela companhia, que geram 476 bilhões de litros de esgoto anuais. Se todo esse material fosse usado na produção de H2, teríamos 52 milhões de mestros cúbicos de H2 anuais, quantidade que abasteceria, diariamente e por um ano, 2.740 veículos elétricos”, afirmou.
Stabile informou, durante o Fórum, que no próximo dia 6 de maio estará na Alemanha, um dos países que mais investem nessa tecnologia, onde será assinado junto à Câmara de Comércio e Indústria (AHK) e Ministério do Ambiente alemães uma parceria na área do desenvolvimento do H2 a partir do biogás proveniente do tratamento do esgoto. Haverá, também, uma visita a uma planta lá existente.
Marcos de Oliveira Costa, coordenador de componente no projeto H2Brasil pela Agência Alemã de Cooperação Internacional (GIZ), que participou de painel no Fórum, elogiou a cooperação entre os dois países e destacou o papel do Paraná neste processo de transição energética brasileira.
“Esta reunião é importante porque fomenta a participação de todos os segmentos da sociedade que poderão, de alguma forma, contribuir e colher os benefícios dessa união. E o Paraná tem muito a oferecer, pela pujança industrial e agrícola, e pela combinação dessas vocações locais com o interesse em descarbonizar a economia, o que pode resultar em benefícios imensos, gerando emprego e renda para o Estado e contribuindo para a redução do aquecimento global”, disse.
AGROPECUÁRIA – Segundo Benno Henrique Doetzer, diretor técnico da Secretaria de Estado da Agricultura e do Abastecimento, que esteve no painel dedicado à competitividade do H2 e às estratégias para a substituição do hidrogênio de fonte fóssil, o Paraná tem desafios próprios para fomentar a produção de energia e também ganha ao tentar neutralizar o potencial poluidor de culturas que ganharam força nos últimos anos.
“Temos no Paraná, hoje, o mesmo número de suínos e de seres humanos, porém os animais geram uma carga orgânica equivalente ao de sete pessoas, um material que precisa ser tratado e disposto corretamente na natureza, e o H2 pode ajudar nesse sentido, reduzindo a pegada de carbono”, destacou.
Doetzer cita que a produção rural no Paraná é difusa, mas que já existem redes próprias conectando produtores e que elas devem ser a base da estrutura logística da produção da nova energia. “Investir nos clusters regionais existentes, como na interligação de redes de biogás, vai ajudar a viabilizar mercados e redes locais de distribuição e a construção de um modelo de negócio prático e efetivo”, disse o diretor.
Ele que cita que, nesse processo, é importante a consolidação de segurança jurídica sobre o tema, o estabelecimento de um modelo de governança que organize essas iniciativas e envolva setor público e privado e que seja promovida ampla difusão da capacitação, tecnologia e inovação na área.
TRANSIÇÃO – As mudanças energéticas transformam das pequenas propriedades rurais às grandes empresas paranaenses, como explica Cassio Santana da Silva, diretor de Desenvolvimento de Negócios da Copel, que tem iniciativas relacionadas ao H2: a companhia tem passado de uma empresa “barrageira” para uma empresa voltada a diversas e inovadoras formas de energia.
“As tecnologias costumam ser impulsionadas por crises, e a Copel entende que o Paraná, com 94% da energia utilizada proveniente de fontes renováveis, pode contribuir para essa urgente transição energética”, disse ele, citando que pesquisas internas têm mostrado que as áreas de siderurgia, vidro e cerâmica podem ser as mais beneficiadas, em um futuro próximo, pelo uso do H2 no Estado.
“Muito se fala da exportação de H2, mas penso que atender o mercado interno pode ser hoje a melhor estratégia para o hidrogênio renovável, visto ainda que o elemento está na base dos fertilizantes, dos quais o Paraná muito depende e vai depender por muito tempo", completou.
Para Christian Wahnfried, da Unidade de Negócios de Bombas a Diesel da Bosch, a discussão sobre transição energética é muito rica, e é preciso congregar iniciativas sempre tendo em mente de que não se pode ter a tecnologia da energia sem ter a fonte abundante para ela, assim como não se pode criar um mercado dinâmico com uma fonte definida, mas sem demanda.
“Até agora, o que o ser humano fez foi tirar o carbono de baixo da terra e colocar na atmosfera. Nossa missão, agora, é focar na tecnologia para a vida, reduzindo a pegada de carbono. E o Brasil tem um potencial grande, visto que, ao contrário de outros países, pobres em alternativas para biodiesel, por exemplo, tem mais de 40 fontes oleaginosas para esse tipo de produção. Porém, apesar da miríade de alternativas, as soluções precisam ser regionalizadas”, disse.
O CEO da Compagas, Rafael Lamastra Jr, esteve no painel “Competitividade do hidrogênio renovável e estratégias para a substituição do hidrogênio de fonte fóssil” e abordou os desafios da distribuição do combustível renovável, das oportunidades de uso, e, principalmente, do desenvolvimento do hidrogênio a partir do gás natural e do biometano.
“Nossa meta é ter um hidrogênio verde e para isso é necessário uma modelagem e um planejamento estabelecido em fases. Num primeiro momento, o gás natural, que já apresenta menor emissão de CO2, e na sequência, a partir do biometano, um gás 100% renovável e paranaense”, destacou.
NOVAS ROTAS – O Fórum respondeu a essa demanda de apontar caminhos, como frisa Eduardo Soriano Lousada, diretor do Departamento de Tecnologias Estruturantes do Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), mobilizando diversos setores da economia, empresas, instituições, universidades, em nível estadual, com outros entes da Federação e com o governo federal, algo crucial visto que a iniciativa envolve tomadas de decisão em relação a políticas energética e ambiental, entre outras.
“O esforço do Paraná ficou claro durante o Fórum, visto o conjunto de documentos, lei e dispositivos assinados hoje para incentivar essa cadeia no Estado. E a economia do H2 precisa ser incentivada, como tudo que começa e é caro, então precisa de incentivos locais e federais, para que isso ocorra, nem sempre como redução de impostos, mas com caminhos que facilitem empreendimentos”, disse.
Lousada fez questão de apontar que, durante o evento, o Paraná colocou seu desejo e disposição em relação à transição energética de modo claro, mostrando força e coordenação com a mobilização das principais forças do estado - Governo, empresas, universidades e terceiro setor.
PRESENÇAS – Participaram dos painéis, ainda, Eduardo de Miranda, diretor DNI do Parque Tecnológico de Itaipu (PTI); Rafael Hernando de Aguiar Gonzalez, diretor-presidente da CIBiogás; Camilo Adas, assessor em Transição Energética da Be8; Aline Scarpetta, gerente de Estruturação de Projetos da Cibiogás; Ramiro Wahrhaftig, presidente da Fundação Araucária; Daniel Augusto Cantane, pesquisador do PTI; Marcos Berton, pesquisador chefe do Instituto Senai de Inovação em Eletroquímica (SENAIPR), da Federação de Indústrias do Estado do Paraná (FIEP).
As discussões contaram também com Gustavo Possetti, gerente de Pesquisa e Inovação da Sanepar; Helton José Alves, diretor técnico-científico da Associação Brasileira do Hidrogênio e Pesquisador da Universidade Federal do Paraná (UFPR); Guilherme Amintas, superintendente de Energias Renováveis da Itaipu Binacional; Nereu Domingues, sócio-fundador de uma holding voltada ao desenvolvimento de projetos na área de hidrogênio (DMGSA); Edgard dos Santos Rocca (Finep); Rodrigo Regis, especialista em Energias Renováveis; Paulo Schimidt, assessor técnico da Secretaria da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior (SETI); Giancarlo Rocco, diretor de Relações Internacionais e Institucionais da Invest Paraná.