Nem só do mar salgado vive o Litoral do Paraná. Um dos municípios mais procurados como destino para o veraneio, Guaratuba é também o maior produtor de banana do Estado. O mar verde desce pelos morros e se estende a perder de vista por 3,3 mil hectares plantados. Rende 61,8 mil toneladas ao ano e garante renda e trabalho para 350 famílias locais.
Guaratuba registra uma produtividade acima da média brasileira: 25 toneladas por hectare. Segundo dados do IBGE para a safra 2020, a produtividade do Paraná é de quase 20 ton/ha e a brasileira é de 14 ton/ha.
A engenheira agrônoma Elaine Cristina Stolf Correa é a segunda geração a cuidar dos atuais 80 hectares do bananal plantado a partir de 1987 pelas mãos diligentes do pai, João Stolf. Ela conta que as bananeiras encontradas naturalmente ali, tinham seus cachos colhidos por extrativismo e levados de barco pela baía para a venda na região.
Vindo de família experiente no plantio de fumo e de arroz irrigado, João e o irmão deram o impulso para a primeira grande onda da cultura da banana em Guaratuba, que hoje corresponde a mais de 40% do Valor Bruto da Produção (VBP) do município – o que corresponde a aproximadamente R$ 63,4 milhões ao ano, conforme dados da Secretaria estadual da Agricultura e Abastecimento.
Elaine e a irmã – engenheira agrônoma e engenheira ambiental, respectivamente – deram sequência às ondas verdes de uma Guaratuba que se acessa por estradas de pedra, pontes e onde se pisa e se pensa na terra.
Acompanhar o pai desde os 4 anos, fez brotar em Elaine o interesse pelo cultivo da terra: cursou Agronomia em Florianópolis, voltou com um olhar apurado para o manejo e a defesa sustentável do bananal e hoje une forças com 55 produtores como responsável técnica da Associação Pró-Agricultura Sustentável de Guaratuba (APASG).
“A minha filha de 7 anos não trabalha ainda, mas é o controle de qualidade das nossas bananas”, brinca.
PRODUÇÃO FAMILIAR – Pai, filha e neta. A estrutura familiar é a base para a continuação da bananicultura na maioria das propriedades e é também a analogia com que se configura o bananal. O sistema chamado “mãe, filha, neta” garante a produção de bananas ao longo de todo o ano.
“Tem a mãe, que seria a primeira planta, que já colhemos o cacho”, ensina Nilton Natal Fedalto. “E a filha e a neta, que são a continuação”, continua Grilo, como é conhecido, em referência ao segundo e terceiro troncos em ordem decrescente de espessura. O que é externo a esse núcleo familiar é cortado.
Cada planta dá um cacho só, o que explica o ditado “bananeira que já deu cacho”. Carlos Henrique Andrade, técnico em agropecuária do Instituto de Desenvolvimento Rural do Paraná – Iapar-Emater (IDR-Paraná), explica essa organização. “A planta que já deu cacho não absorve mais nutrientes do solo. A filha dela, que vai produzir no próximo ano, começa a absorver os nutrientes da planta-mãe até começar a formar o novo cacho, e assim sucessivamente”, explica.
A parte do tronco que vai ao solo sofre decomposição e a renovação é contínua, com as "novas gerações". Para produzir esse único cacho, a planta leva um ano e meio em média – um ano para emitir a flor que vai dar origem ao cacho e mais outros quatro a sete meses para “engordar” as bananas, dependendo da temperatura.
“Sai um botão e depois vai abrindo folha por folha, cada folha tem uma penca. E vai abrindo até que no final só tem as que são de flor masculina e não dão mais fruto”, afirma a produtora e agrônoma Elaine.
O cacho depois é ensacado em plásticos, que podem ter diferentes cores para identificar mais facilmente quais estão na mesma fase de maturação.
MERCADO – Com as bananas ainda verdes, os cachos colhidos são levados às etapas de lavagem, despenca e embalagem. No barracão da empresa Banaze, localizado na comunidade Caovi, em Guaratuba, Vagner Souza da Silva dispensa em poucos segundos um cacho que pesa, em média, 35 quilos para a caturra e 25 quilos para a prata, ficando apenas o engaço – suporte que sustenta os cachos. Habilidade de quem trabalha há sete anos na área.
Destinada ao mercado interno e ao consumo in natura, a produção da maioria dos bananicultores de Guaratuba é repassada a um intermediário da Ceasa de Curitiba e vendida direto no box ou ainda na pedra, que é quando o produtor transporta e vende seu produto diretamente em uma unidade da Ceasa.
Há também venda para a merenda escolar. No caso da produção da família da Elaine, 90% vai para o Rio Grande do Sul, por meio de um atacadista, onde fica na estufa até amarelar por uns três ou quatro dias e daí segue para os supermercados.
A banana, aliás, é a fruta mais consumida pelos brasileiros: em média 16,3 gramas ao dia por pessoa, de acordo com a Pesquisa de Orçamentos Familiares do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) de 2017/2018. O caminho até o consumidor, porém, envolve muito trabalho, dedicação e superação.
DESAFIOS – Um desafio recente para toda a cadeia produtiva da banana em Guaratuba é a recuperação após a destruição causada pelo ciclone-bomba de 2020, que praticamente dizimou as áreas da espécie caturra (ou nanica) no município, e prejudicou bastante as de banana-prata, porém com perdas menores.
André Fagundes Resende, com 22 anos de trabalho nos bananais, presenciou os efeitos da tempestade. “Derrubou quase tudo aqui, o que não derrubou o vento rasgou e caíram as folhas. A gente foi colhendo os cachos da banana-prata, que é mais resistente”, relembra ele, que é funcionário na Banaze.
Além de fatores e desastres climáticos e da lida diária para manter o bananal nutrido, os produtores lutam diariamente contra pragas. Para combater a Sigatoka-negra, doença da bananeira temida em todo o mundo, os bananicultores de Guaratuba contam com o monitoramento da equipe do IDR Paraná.
“Toda semana visitamos o bananal em algumas plantas previamente estipuladas e verificamos a ocorrência, ou não, da doença. Esse monitoramento acontece para que os produtores possam visualizar se há a entrada da doença e então fazem a aplicação dos defensivos recomendados pela pesquisa”, explica Nilo Bragagnolo, engenheiro agrônomo do IDR Paraná.
A pulverização dos fungicidas costuma acontecer de 6 a 8 vezes ao ano em Guaratuba, uma média bem abaixo da praticada em muitos países produtores.
SÉRIE – A banana de Guaratuba faz parte da série de reportagens “Paraná que alimenta o mundo”, desenvolvida pela Agência Estadual de Notícias (AEN). O material mostra o potencial do agronegócio paranaense. Os textos são publicados sempre às segundas-feiras.
Banana está no programa Vocações Regionais Sustentáveis
A banana está entre os produtos que o projeto Vocações Regionais Sustentáveis (VRS) Mata Atlântica, desenvolvido pelo Governo do Estado, elencou com potencial de mercado, com o objetivo de introduzir inovação e agregar valor.
O coordenador do VRS na Invest Paraná, que presta assessoria técnica aos produtores e empreendedores locais, Bruno Banzato, conta que produtores e proprietários de pequenas agroindústrias dos municípios de Morretes, Antonina e Guaraqueçaba (o segundo maior produtor de banana no Paraná; o terceiro é Novo Itacolomi, na região Norte) participaram na primeira oficina da cadeia de valor da banana e seus derivados.
“A oficina foi um trabalho inicial. Estamos desenvolvendo agora as análises econômicas, ambientais e sociais. Acreditamos muito no potencial desses produtos e no trabalho de agregar valor. Queremos contar a história desse produto, a qualidade, a originalidade, para que o produtor tenha uma renda maior”, destaca Banzato.
O incentivo ao processamento da banana busca oferecer mais produtos derivados da fruta, como as balas com embalagens verde (Antonina) e laranja (Bananina) que receberam o reconhecimento de Indicação de Procedência.
Mais produtos podem entrar logo para a lista de ofertas incentivadas: banana-passa de Guaraqueçaba, chips de banana de Morretes e, se depender da Elaine, a farinha de banana verde da propriedade da família, em Guaratuba.
O programa Vocações Regionais Sustentáveis é uma política integrada entre diversas instituições governamentais. Além da Secretaria do Desenvolvimento Sustentável e do Turismo participam as secretarias de Justiça, Família e Trabalho; da Agricultura e Abastecimento e do Desenvolvimento Urbano e Obras Públicas, o Paranacidade, o Instituto Água e Terra (IAT), o IDR-Paraná e o Instituto Paranaense de Desenvolvimento Econômico e Social (Ipardes), e universidades e comunidade.