A preservação das matas de araucárias no Sul do Estado vai além da conscientização ambiental e histórica da manutenção de um dos principais símbolos paranaenses. É também graças às sombras das frondosas árvores nativas que a região consegue produzir uma erva-mate especial, de sabor único no mundo, reconhecida desde 2017 com o selo de Indicação Geográfica (IG). E faz do Paraná o maior produtor da matéria-prima sombreada para o chimarrão no País – foram 532,89 mil toneladas em 2018.
Conferido pelo Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI), o IG reconhece produtos ou serviços que são característicos do seu local de origem, o que lhes atribui reputação, valor intrínseco e identidade própria, além de os distinguir em relação aos seus similares disponíveis no mercado. São produtos que apresentam uma qualidade única em função de recursos naturais como solo, vegetação, clima e saber fazer.
É essa a história da erva-mate paranaense, com origem nos municípios de São Mateus do Sul, São João do Triunfo, Antônio Olinto, Mallet, Rebouças e Rio Azul, que embala a série Feito no Paraná, compilado de reportagens que busca valorizar e divulgar a produção local.
Base para o chimarrão, tererê (ou tereré dependendo da localidade) e chás, entre outros produtos, a erva-mate desempenhou papel significativo na história do Paraná e no Sul do País como um todo. Atualmente, gera empregos e renda ao longo de toda a sua cadeia produtiva. São cerca de 37 mil famílias (propriedades) vivendo diretamente da atividade no Estado, segundo o Conselho Gestor da Erva-Mate do Vale do Iguaçu (Cogemate). Além, claro, da sustentabilidade, já que a produção conserva a fisionomia vegetal nativa, sendo que a maior parcela de produção paranaense é proveniente de ervais nativos ou sombreados.
Levantamento mais recente do Departamento de Economia Rural (Deral), da Secretaria de Estado da Agricultura e Abastecimento, de 2018, revela que o Paraná apresentou um Valor Bruto da Produção (VBP) dos produtos florestais de R$ 4,42 bilhões. Deste total, 84% são de produtos madeireiros (serraria, papel e celulose, placas e painéis e lenha) e 16% da linha não madeireira (mate, palmito e pinhão).
Neste conjunto, a erva-mate foi responsável por 13% de participação dos Produtos Florestais, com um valor de R$ 591,8 milhões. É um aumento de 2 pontos percentuais em relação a 2017, em que obteve 11% de participação, com R$ 435,4 milhões.
Ainda segundo o Deral, a produção de erva está presente em 136 municípios paranaenses, com concentração na Região Sul – os núcleos regionais de União da Vitoria, Guarapuava e Irati são responsáveis por 81,7% do VBP do Estado. Os maiores produtores foram Cruz Machado, São Mateus do Sul, Bituruna, Santa Maria do Oeste e General Carneiro.
A BARONESA DO MATE – São Mateus do Sul, por exemplo, tem uma baronesa do mate. Márcia Regina Ransolin da Silveira é proprietária da ervateira Baronesa, uma das quatro indústrias da cidade capacitada a produzir o mate com selo de Indicação Geográfica. Ela conta que o reconhecimento ajudou a impulsionar os negócios da família, já na quinta geração, e de quebra resgatou o turismo na região.
É comum a empresária receber levas de estudantes, especialmente do ensino fundamental, interessados em conhecer o modus operandi do chimarrão. Saem de lá sabendo desde de como as mudas brotam nos pés dos pinheiros até o empacotamento do produto, antes de a embalagem ser encaminhada aos pontos de venda.
“Conto para eles que a nossa erva-mate tem sabor único, muito bom, gostoso. É mais suave do que a de outros lugares sem precisar acrescentar açúcar. Isso porque as plantas crescem em áreas sombreadas pelas florestas nativas”, afirma Márcia, que é também presidente do Sindicato da Indústria do Mate no Estado do Paraná (Sindimate).
Segundo ela, a Baronesa produz em média 25 toneladas de erva-mate por mês, divididas nas categorias chimarrão, chá e tererê. Com 5 empregos diretos, número que salta para mais de 30 na época da safra, entre junho e setembro, a ervateira é um polo que ajuda a consolidar São Mateus do Sul como o segundo maior produtor do Estado.
Em 2018, de acordo com o Deral, foram 70 mil toneladas, atrás apenas de Cruz Machado (92 mil toneladas) no ranking paranaense. “O IG agregou valor e garantiu uma referência para o produto. Mostra que tem um diferencial”, diz a empresária, que conta, via sindicato, 123 ervateiras na região.
EXIGÊNCIAS – Gerente comercial da ervateira Maracanã, dona da marca São Mateus, o engenheiro agrônomo Fernando Toppel é capaz de passar horas falando sobre o potencial que a região alcançou com a conquista do IG. Ele tem na cabeça todos os procedimentos que se precisa tomar para garantir a erva-mate de excelência.
“É um caderno de especificações técnicas. São ações que vão desde a muda que precisa ter a genética local até normas e padrões de segurança e produção como boas práticas agrícolas e boas práticas de fabricação na indústria”, revela.
De acordo com ele, exigências que agregam valor. Um pacote de mate para chimarrão com o selo IG chega a custar de 30% a 50% a mais do que o produto convencional, diferença que acaba se refletindo também no bolso do produtor. “Temos um potencial gigantesco no Brasil, basta o consumidor assimilar que está pagando um pouco a mais porque é um produto diferente, único, especial, como é o champanhe na França”, ressalta ele. “O trabalho está engatinhando, ainda vamos crescer muito”, ressalta.
EXPORTAÇÃO – Processo que já está mais avançado no Uruguai, por exemplo. Lá, explica Toppel, eles fazem questão de pagar mais por uma erva com procedência. Ainda mais se for paranaense. O Deral mostra que o País vizinho é o principal importador do mate do Paraná. Foram 1.592 toneladas em 2018.
Canal aberto que fez com que a Baldo, a maior ervateira do Brasil, do Rio Grande do Sul, se instalasse em São Mateus do Sul. É desta planta que ela produz a erva com IG que vende para alguns países da América do Sul, principalmente para o Uruguai. “E mesmo o mate que eles tomam lá no Rio Grande do Sul é um pouco nosso também. Indústrias ervateiras de lá, que possuem filiais aqui no município, compram a matéria-prima da nossa região e fazem o chamado blend, adicionando uma porcentagem da erva produzida em São Mateus para deixar o sabor mais suave”, diz o engenheiro.
“A exportação aumentou muito desde 2018, enquanto o consumo local ficou meio estagnado. A erva-mate caiu no gosto lá fora, especialmente de países como Estados Unidos, Alemanha e Síria”, acrescenta o presidente do Cogemate, Naldo Vaz.
A Maracanã, da família Toppel, produz em média 20 toneladas de erva-mate por mês, divididos em chimarrão e chá-mate. São cinco empregos diretos.
FEITO NO PARANÁ – Criado pelo Governo do Estado, o projeto busca dar mais visibilidade para a produção estadual. O objetivo é estimular a valorização e a compra de mercadorias paranaenses. O projeto foi elaborado pela Secretaria do Planejamento e Projetos Estruturantes e quer incentivar a economia e a geração de renda.
Empresas paranaenses interessadas em participar do programa podem se cadastrar no site http://www.feitonoparana.pr.gov.br
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Confira as reportagens já produzidas para a série que destaca o que é Feito no Paraná.
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Com turismo em alta, São Mateus do Sul ganha uma rua só para a erva-mate
A indicação Geográfica da erva-mate assegurada pela Região Sul do Paraná rendeu outros benefícios indiretos. Alguns deles ligados diretamente ao turismo. É o caso da Rua do Mate, uma via coberta, que valoriza a cultura e a socialização do chimarrão que está em fase final de construção em São Mateus do Sul.
Localizada na área central da cidade, a obra do Governo do Estado será um espaço de convivência, onde famílias e visitantes poderão se encontrar para colocar a conversa em dia e tomar uma cuia de chimarrão.
Também vai concentrar atividades culturais, eventos e fomentar o comércio, principalmente de produtos típicos da região. A Secretaria de Estado do Desenvolvimento Urbano e Obras Públicas investe R$ 2,1 milhões no projeto, previsto para ser entregue em outubro.
A Rua do Mate fica em um ponto estratégico e dá boas-vindas para quem chega a São Mateus do Sul pela BR-476. Está entre o antigo convento, hoje sede da Secretaria Municipal de Educação, Cultura e Turismo; a igreja do padroeiro São Mateus e a Casa da Memória Padre Bauer – que abriga a história da erva-mate, da imigração polonesa e da navegação a vapor que são símbolos da cidade.
O já instalado chimarródromo, um espaço com torneiras com água quente para abastecer as cuias de chimarrão, é um dos principais atrativos da Rua do Mate. A disposição dos bancos em frente a esse local é quase como uma roda de chimarrão, destacando o caráter social da bebida, que quase sempre é tomada em companhia. Mudas de erva-mate também estão sendo plantadas ao longo dos mais de 3 mil metros quadrados da obra.
A Associação dos Amigos da Erva-Mate de São Mateus do Sul pretende instalar um quiosque no local para comercializar uma série de produtos derivados da erva-mate, que vão desde o tradicional pacote para chimarrão passando por sabonetes, pães e doces.